O fim do mundo de 2012 foi abordado significativamente pela imprensa e pelo cinema. Obras como “2012”, de Roland Emmerich, e “Melancolia”, de Lars von Trier, jogaram o olhar sobre um dos maiores medos da humanidade: a destruição de tudo. A temática é frequente até mesmo quando não se baseiam em profecias, já que o público do cinema adora uma boa história de destruição e superação. No entanto, alguns acreditam que o mundo em que vivemos está acabando aos poucos, seja pelas condições climáticas cada vez mais irregulares ou pela violência e corrupção da sociedade. O cinema colombiano também deu sua contribuição para a temática partindo desse ponto de vista.
Em “Crônica do Fim do Mundo”, filme de 2012 que estreou apenas esse ano no Brasil, o fim da Terra é apenas algo agendado que amedronta algumas pessoas. Não existe espetacularização do fato ou mesmo efeitos visuais mirabolantes, até porque é uma produção de baixo orçamento e que passou despercebido do grande circuito. O roteiro de Mauricio Cuervo, também responsável pela direção do longa, usa a ideia do fim do mundo para desenvolver a vida triste e desordenada de seus personagens.
Victor Hugo Morant interpreta Pablo, um senhor ranzinza que há 30 anos não sai de casa. Traumatizado pelo que já viu das pessoas, ele se isola em um apartamento quase sempre escuro, com medo do que há lá fora e à espera do juízo final. A trama acompanha também seu filho Felipe (Jimmy Vasquéz), que divide seu tempo entre cuidar da esposa, do filho, do pai e do amigo em decadência. Os dois personagens, desenvolvidos com brilhantismo por seus intérpretes, são a fortaleza da trama.
A raiva que Pablo sente é descontada diariamente quando ele decide ligar para todos os seus desafetos e falar verdades humilhantes. É como se, com a possibilidade do fim do mundo, ele agora quisesse limpar toda a sua frustração em relação às pessoas para poder morrer em paz. Ou então é uma forma que tem para se entreter, já que estar trancafiado dentro de casa não é muito emblemático em sua vida. Entretanto, em uma de suas ligações, Pablo não esperava ser ameaçado de volta. O medo que já guardava pelo mundo agora acentua-se, desenvolvendo um interessante suspense na película. O diretor Mauricio Cuervo consegue elevar a tensão em diversas cenas com Pablo de forma primorosa.
Já Felipe tenta provar a todo tempo que é um bom pai e um marido dedicado. Em paralelo, ele grava imagens pelo celular das ruas para Pablo, como forma de mostrar que o mundo ainda existe. O problema é que seu mundo é tão depressivo quanto o do pai, e eles se sustentam para não desabar completamente. Mais do que um filme sobre o fim do mundo, este é sobre relações familiares e a angústia da perda. É como se o juízo final fosse bem-vindo ao universo daqueles personagens, ao mesmo tempo em que usam essa desculpa para eliminar ou potencializar seus problemas.
Mauricio Cuervo realiza um filme bastante simples, com poucas locações e baixo orçamento, mas trabalhar com primor a psicologia de seus personagens. Dispondo de equilibradas fotografia e direção de arte, que se aproveitam dos cenários tristes, sombrios e solitários, o roteiro de Cuervo ainda abre espaço para o uso do humor, principalmente durante as ligações de Pablo. O drama e o suspense são bem trabalhados, culminando em um desfecho que traz um pouco de esperança de um mundo diferente.
Refletindo como traumas do passado podem transformar as pessoas no decorrer do tempo, “Crônica do Fim do Mundo” é um trabalho correto dentro da cinematografia colombiana, não muito lembrada pelo mercado mundial, se comparada a outros países. Uma obra que traz uma visão de um mundo cada vez mais delicado e amedrontado.
Avaliação: 8/10
Texto originalmente publicado no Cinema com Rapadura.