Crítica | O Rastro (2016), de J.C. Feyer

Avaliação: 3/5

Apesar de a comédia ser o gênero mais famoso no circuito comercial do cinema brasileiro, os realizadores nacionais estão cada vez mais atraídos por outras experiências, especialmente nos curtas-metragens, onde o suspense e o terror têm sido explorados com certa frequência.

O que faz de “O Rastro”, primeiro longa-metragem J.C. Feyer, um produto especial é o caráter de ser feito para as telonas, não para festivais, de um filme de gênero. Além disso, o cineasta também não tenta esconder os símbolos norte-americanos tão utilizados pelo cinema de horror dos EUA, reproduzidos sem limites.

Assim, Feyer joga seu olhar de cinéfilo ao juntar todas essas referências em um filme que não necessariamente surpreende, mas que é notável pelo seu desempenho como estética. Não que isso seja um problema, já que até para referenciar uma filmografia é preciso certa competência para não parecer exclusivamente uma cópia batida.

A história acompanha João, interpretado por Rafael Cardoso, médico responsável pelo redirecionamento de pacientes de um hospital que está prestes a fechar. No entanto, uma garota acaba sendo internada e some misteriosamente. Enquanto procura pela menina, João começa a descobrir esquemas invisíveis entre as instituições de saúde e a população.

Como também tem sido comum no cinema mundial, os filmes de gênero têm tentado seguir por um lado mais político, refletindo questões que atingem a sociedade de hoje. Em “O Rastro”, Feyer discute o sistema de saúde no Brasil, a corrupção integrada nas instituições e a pobreza do atendimento nos hospitais.

Não chega a se aprofundar nisso, a não ser no terço final da projeção, pois o roteiro está mais preocupado em criar um tom de paranoia entre João e as pessoas ao seu redor, especialmente sua esposa, interpretada pela sempre competente Leandra Leal.

Feyer segue todo o cardápio dos filmes de horror norte-americano, incluindo a garotinha bizarra, os sustos causados pelo som alto e os personagens ambíguos. Nada tão surpreendente em termos de história, mas que se mostra um bom exercício de imagem. A direção de fotografia, o design de produção e o desenho sonoro são milimetricamente bem pensados para compor a sensação de incerteza e perigo que a obra precisa.

Ainda que esteja longe da qualidade de filmes de gênero efetivos realizados por cineastas como Juliana Rojas, Marco Dutra, Gabriela Amaral Almeida e Lucas Sá, para citar alguns, “O Rastro” se compromete com o público cinéfilo que já viu aquilo ali antes, mas está aberto a ver o cinema nacional pensar o circuito comercial de outras formas. Ao final da projeção, Feyer atiça a curiosidade para seus próximos projetos, em especial aqueles que ele coloque mais de si como realizador do que de suas referências.

Publicado originalmente pelo autor no Jornal Diário do Nordeste.

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