Crítica | Avó (2015), de Asier Altuna

amama2Avaliação: ★★★★

Primeiro longa-metragem de Asier Altuna, premiado no Festival de San Sebastian, “Avó”(2015) foi o escolhido para abrir a 26ª edição do Cine Ceará – Festival Ibero-americano de Cinema, que demonstra nos últimos anos uma curadoria madura. Situando as relações familiares em um caserío basco, com laços tradicionais que colocam as gerações em choque, o filme elabora uma narrativa repleta de simbolismos e densidade psicológica, interligados pela figura da avó que dá título à obra.

A avó carrega a tradição familiar por meio de seu silêncio, como uma base sólida e inquestionável, enquanto os demais personagens seguem seus conflitos prórios. Naquela família, há um certo maneirismo retrógrado de enxergar seus descendentes. A escolha de seus futuros (o herdeiro, o preguiçoso e a rebelde) tenta determinar o destino, porém é quebrado pela impossibilidade tão óbvia de ter isso sob controle. É justamente a rebelde Amaia, interpretada por Iraia Elias, que balança as relações familiares, com a necessidade tanto de procurar se encontrar como pessoa quanto de expressar sua arte.

Isolados, a passividade do contato com o mundo sufoca os que restaram no caserío. Mesmo em campo aberto, há uma sensação de clausura social que transforma os personagens em quase matutos. O filho Tomás (Kandido Uranga), pai de Amaia, demonstra sua não expectativa de mudanças, como se esperasse somente o tempo passar para dar continuidade à herança familiar. A rotina de Tomás ali é metódica, onde qualquer limite jamais parece ser quebrado e não há espaço nem para fazer carinho nos cachorros.

A relação com a natureza é outro feliz acerto do roteiro. Ao nascer, um descendente ganha uma árvore na floresta, pintada de uma cor que vai determinar sua personalidade. Acontece na floresta uma das sequências mais significativas de “Avó”, quando Tomás decide punir Amaia por sua inconsequência. A família que tanto prezou pela união da prole percebe que o admirável mundo novo está em constante mutação e que sempre haverá novos conflitos que nem todos conseguem suportar. Às vezes, não sabem se suportar.

A narrativa opta por estudar os personagens com mais calma para significar a visão de mundo que existe naquele ambiente inóspito. A imagem da avó multiplicada e sua decaída causam um impacto profundo naquele cenário, enquanto pai e filha tentam acertar suas diferenças. A direção de fotografia é um dos destaques visuais do longa, sempre precisa e eficaz, assim como a trilha sonora que dá vazão ao turbilhão de sentimentos do roteiro.

A precisão de Altuna ao contar uma história que mescla o real e o onírico rende um filme que questiona a fé no passado e a resistência ao futuro, como se houvesse medo em aceitar o novo (a avó é um personagem assombroso, uma ótima personificação do medo). Também mostra a relação sentimental com a natureza e com a arte, seja com as raízes de uma árvore cortada que precisa ter nova utilidade, seja com a música na última cena que une os personagens em uma celebração fúnebre da vida.

Filme visto no 26º Cine Ceará – Festival Ibero-americano de Cinema.
Publicado originalmente no site da Aceccine.

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